quarta-feira, 23 de novembro de 2011

A rosa-dos-ventos da vida

E foi assim com Fernando. Uma luz intensa mas tão breve que fomos nós que ficamos recém-nascidos.  Recém tocados pela impotência. Engatinhando no luto. Provando a fragilidade da vida.

Fernando, tão pequeno, de alguma forma foi mestre. Ensinou-nos na prática o amor e a transitoriedade. E a vida agora não se explica, apenas esgota-se. E para esgotar, tem que desaprender a decepção, a revolta, o desancanto e o desamparo. Viver lições pachorrentas de paciência e aceitação.

Escrevo para mapear em palavras algo que ainda não encontro em sentimentos. Por que talvez seja a vida uma grande aula de cartografia. Apresentando-nos sempre novos lugares para serem interpretados.

Sempre odiei meus cadernos de cartografia, no colégio, percebo que era falta de imaginação. Não enxergava nos mapas a realidade que representavam, como não imaginei que passaria por tanto desnorteamento. Queria um GPS que funcionasse e me levasse ao menos uma vez ao lugar que planejei.

Mas viver é um desbussolamento só.

Depois de um dia de sol, pode-se esperar pelas estrelas. A lição amarga é adoçada pela constelação de lembranças que nos guiam para seguir a navegação.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Desejos na despedida

Que a dor esgote, assim como as palavras.
Que nosso amor transborde e adoce essa saudade.
Que a intensidade da breve felicidade reverbere sempre sua presença.
E que a vida volte a um amanhecer ensolarado que nos ilumine como o seu sorriso.

Adeus, pequeno.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Esfregando carambola na cara da sociedade

Esse blog foi criado para desabafos e impressões mais íntimas de mim para mim mesma. Algo tão complexo e profundo que, segundo o Google, uma das expressões que mais traz visitantes a esse espaço é mulher carambola.

Sente o drama e SIMATA, mulher banana! 

Deus e o diabo no menu do jantar

Deus come quieto, mas o diabo lambe os beiços e os pratos, alertou Guimarães Rosa. E de empolgação, a gente acompanha o segundo. Come que se farta da vida. Por fim, contabilizamos o que dá para digerir, arrotamos o necessário e juramos nunca mais encarar a ressaca de não consumir a vida com moderação.

E torcemos para que, ao menos, no cafézinho, junte-se à mesa um anjo. De xícara em punho e mindinho em riste, ele se oferece para tirar os pratos e juntar as migalhas. Mas a prevenção dura até a próxima tentação. Por que Deus serve arroz integral com frango, enquanto o diabo prepara costelinhas no mel com pudim de sobremesa.

E só me repito: vai minha filha! Vai ser avestruz na vida, por que você não nasceu para dieta de passarinho.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O portão

O portão da casa da minha avó era um pouco mais alto que eu-menina, arrastando boneca. Quando a noite se pintava de café com leite, diariamente, era proferida a pergunta solene: alguém já fechou o portão? Enquanto um se encarregava da medida, todos na sala ouviam o passar da corrente, quase sem respirar, até o cadeado pender num baque entre as grades. 

Hoje, são tempos de portões automáticos, acionados remotamente, encerrados em voltas entre lençóis ou trancas de Rivotril. Memória é arquipélago. Fiquei nadando em volta daquele portão, depois de um dia longo que parecia não terminar. E eu voltei àquele acerto de contas cotidiano que encerrava e reabria novo dia. Proteção nada ingênua, que minhas noites de insônia vêm ensinando a saudar.


quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sentindo pelo avesso

E pelo avesso vai doendo tudo aqui*. Por que do direito, ser feliz é exercício. Cansa e faz doer até os ossos. Alongo as dores em penas sem sentido. Mas de que importa o sentido se a gente está sentindo? 

* de doces Borboletas no Olhos da Lu.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Saudades...


Toda falta sentida é falta mantida da gente mesmo.
Saudades é não estar onde eu me encontro.

ZÉCUTIVA: Mimimi

Será que são recorrentes, em outros botecos, os dias em que a máxima gerencial resume-se a me abraça que eu não dou conta?

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Dos diálogos esclarecedores com os homens

- Acho que o penúltimo carinha que eu saía fugiu depois que eu fiz ele assistir comigo o programa da Inezita Barroso, que eu amo.

- Hahahahahahahaha! A gente quer ver filme pornô com as pretendentes, não Inezita Barroso.

O título deste post também poderia ser porque eu sou um bicho estranho.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Da sapiência do não saber

Eu não sei nada sobre as grandes coisas do mundo, mas sobre as pequenas eu sei menos.
Manoel de Barros

Quanto mais eu vivo, sinto o enlevo de não saber. Por que, quanto mais eu sei, pressinto o dissabor do que há de ser.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Meditando sobre os próprios hormônios

Mude sua mente, mude seu mundo (Geshe Kelsang Gyatso). Se duvidar da proposição, consulte uma mulher na TPM. É tão científico.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Ponto final em eu te amo

Se querer amar é desejo de fazer as malas da própria alma, amar é eleger um destino final para viagem.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Deus te leia

Chega de Deus te ouça. Deus está surdo de tantas súplicas. No máximo, Ele faz leitura labial, quando estiver olhando para você. Portanto, articule muito bem seus desejos.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Resta-me apenas todo o tempo

Quando encara-se firmemente esse negócio de viver, percebe-se que não sobra tempo para mais nada.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Viver para não escrever

Estou de dieta de palavras. Evito escrevê-las.  Como se o registro desperdiçasse a tinta de momentos seletos. Estoco sensações temendo o próximo inverno, em um almoxarifado sem método ou rótulos. Ainda que em desordem, estou satisfeita com a delicadeza do que venho poupando.

Tento decifrar essa música cor de rosa que não para de me adoçar. Desculpo-me se não divido. Mas viver tem me custado todo o tempo.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Sonhos e dia do Budinha

Tive grandes e pequenos sonhos. Mas ainda quero aprender a sonhar do tamanho certo. Que não sejam sonhos apertados que mal comportem a felicidade. Nem tão espaçosos que eu me perca de mim.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Fragmentos em eu



Sou um todo partido, ou partes de um todo?
Francamente, fragmento-me.
E que eu seja uma porção.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Para dias de idéias obsessivas

Foto tirada durante o Arte na Vila, ateliê de Eduardo Mello



"Vendo infelicidade em visões e opiniões, sem adotar nenhuma, encontrei paz interior e liberdade. Quem é livre não se agarra a visões nem discute opiniões. Para um sábio, não há superior, inferior nem igual; não há lugares em que a mente possa se fixar. Mas os que se prendem a visões e opiniões andam pelo mundo aborrecendo as pessoas".

Jack Kornfield (EUA, 1945 ~) “Depois do êxtase, lave a roupa suja”
Do lugarzinho onde venho coletando inspiraração http://samsara.blog.br/

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Sou uma criança, não entendo nada

Ultimamente, em meio a tantas notícias absurdas - guerras, chacinas de adolescentes, tsunamis - ficamos mais infantis. Porquês ecoam interrogações. É sem justa causa e são tantas as causas. E engolimos as perguntas tentando aceitar.

Por que sim.

Arnaldinho e Tremendão para aliviar a segunda.


terça-feira, 5 de abril de 2011

Pontuando amores



(...)
Quero que a gente seja feliz.
Seria ponto final (.)
Mas seu amor emendou,
Em vírgulas e interrogação (,?)
E a felicidade não perdoou
Foram muitos erros de pontuação.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Psicografia da beleza morta


Do melhor de mim ardem saudades. É a latente ausência de quem eu era. 

Chorei para que o que me foi arrancado me dite mensagens do além. E me reconforte dizendo continua. Para renovar  a desencarnada esperança de trapezista.

Preciso completar a metade mais difícil do perdão que falta. Não falo do perdão dos fatos culposos, mas a compaixão pelos atos dolosos que levaram à morte de mim mesma.



sexta-feira, 1 de abril de 2011

Auto mediação de hipóteses

Que a síndrome do SE transforme-se na cura apaziguante do É.

Inspirado na vizinha borboletasnosolhos.blogspot.com, onde sempre vou buscar xícaras de açucar.

terça-feira, 29 de março de 2011

A saga dos meus polegares opositores


As mulheres da minha família são bordadeiras, tricoteiras, cozinheiras, costureiras prendadíssimas, há umas três gerações. Eu sofri mutação genética. Tesoura escolar sem ponta é instrumento perfuro-cortante com potencial letal nas minhas mãos.

Na escola, fugia de trabalhos manuais. O terror era fazer maquetes. Um educador da Gestapo deve ter criado a prática para torturar alunos e desperdiçar recursos do planeta. E eu passava a semana inteira fazendo a maquete do prédio do colégio. O resultado era uma reprodução sem escala de uma escola bombardeada em Saravejo.

Minha mãe, artista e prendada, sempre me salvava. Talvez fosse vergonha do produto final do meu esforço craft. E eu entregava maquetes que poderiam ser expostas na Bienal de Arquitetura. Quando ela parou de fazer meus trabalhos manuais, os professores devem ter achado que sofri um derrame cerebral.

Atualmente, cozinho com a carteira do convênio médico à mão. No caso de amputação acidental, não sujo de sangue a bolsa, procurando o documento, na entrada do pronto socorro.

Com tanta habilidade, passei a considerar os designers de embalagem os sucessores dos educadores da Gestapo. Por que projetam frascos tão difíceis de abrir? Nem o velho e bom abridor de latas salva. Será um complô contra a mulherada que vive sozinha? Com a última embalagem, fiz praticamente um Kama Sutra de posições para tentar abrí-la. E ela reina absolutamente lacrada em cima da pia da cozinha à espera de uma solução.

Depois de superar a saga escolar de trabalhos manuais, tenho que ser cuidadosa, no supermercado, quanto às armadilhas das embalagens invioláveis. Além de passar fome com a comida inacessível, morro de desgoto ao pensar que se dependesse do meu polegar opositor, certamente a humanidade estaria nas cavernas. Ou melhor, estaria nas cavernas, procurando um disk pizza, amaldiçoando o maldito fogo que não consegue fazer batendo pedrinhas.

domingo, 27 de março de 2011

Trazer de volta a pessoa amada

Escrever é fazer despacho de palavras, na encruzilhada de parágrafos. É distribuir oferendas de frases. Traz de volta a pessoa amada. Nesse caso, o próprio autor.

sábado, 26 de março de 2011

Amar é fazer as malas da alma

"Amar é mudar a alma de casa", ensinou Mario Quintana. E que a Granero trabalhe mais na vida de todos nós. 

Fiquei emocionada ao receber o convite de casamento de casal amigo que espera um bebê. Fui invadida por um calorzinho de esperança e também saudades.

Querer amar é  desejo de fazer as malas da própria alma. Entretanto o amor é agência de viagens em alta temporada, não respeita itinerários e nem horários para alçar vôos.


"O amor não se tem na hora que se quer, ele vem no olhar
Sabe ser o melhor na vida e pede bis quando faz alguém feliz"
Marcelo Camelo



 

quarta-feira, 23 de março de 2011

Zécutiva: meu melhor salário não tem preço

Recebi um abraço sorridente de um jovem colega agradecendo nossos bate-papos, enquanto atravessava o fim do seu casamento. Alguns dias antes, ganhei mais abraços lambuzados em lágrimas de uma funcionária. Ela voltou para o batente, depois de um ano de afastamento lutando contra um câncer, período em que a empresa tentou minimamente ampará-la.

Fazer o ótimo invés do bom, quando se trata de pesoas, é o melhor investimento que um profissional pode fazer em sua carreira. Por que as melhores realizações profissionais são aquelas para as quais não somos pagos em dinheiro. Afinal, se trabalhar fosse bom mesmo, holerite não existia.

terça-feira, 22 de março de 2011

Sobre caçadas (d)e homens

"Eu não tenho estilo de homem, tenho pressa", escutei de uma amiga, incinerando o próprio filme numa roda de amigos em um bar. Sorri amarelo. Estou em fase completamente oposta. Não corro mais atrás nem do garçom para alcançar a bandeja. Se tiver que provar, que seja servida, sem esforço.

Sempre ouvi do alto da filosofia masculina de meus irmãos que para treinar qualquer bola serve. Mas cansei de bola de meia. Se não pintar bola de couro, não treino. E mudar de esporte, definitivamente não é minha praia. Mas talvez tenha que levar um lanchinho na bolsa, para não ficar faminta a esperar o garçom.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Parfum du Tostex

Agüo (me recuso a abandonar o trema) o café, torro o pão de forma. Coloco na janela o pão, agora forma de carvão. Espraio fumaça pelos vizinhos. Leio meia dúzia de manchetes no jornal, enquanto o iogurte escorre na roupa limpa. Por fim, saio atropelando meu próprio atraso. Feitiço do tempo nosso cada dia.

A maior conquista de paciência é ter paciência consigo mesmo. Aceitar as coisas como elas são, principalmente na cozinha, no meu caso. Ri melhor quem ri primeiro de si mesmo. E para os narizes sensíveis, digo que a fragância de pão tostado é novíssimo lançamento da coleção gourmet da Victoria Secrets.

Fim de semana, girando a roda



 




sexta-feira, 18 de março de 2011

Meu feliz duplo aniversário

Já tentei inúmeras vezes resumir a imensa alegria que estou sentindo. Mas constatei escassez de palavras. Completo mais um ano de vida, esse plenamente vivido. E ontem completei um ano trilhando um novo caminho que vem me proporcionando profunda paz e descobertas. Então agora, tenho duas idades (sendo que uma delas, eu minto para burro).

Só tenho a agradecer essa felicidade como há muitos anos não vivia. Agradeço minha família, amigos queridos e todos aqueles que me mandaram boas vibrações (tenho certeza que foram toneladas delas). E agradeço ao Google. Numa busca ordinária, ele indicou novos sentidos à minha história.

Dedico tudo o que conquistei a felicidade de todos. E não me agradeçam porque eu quero minha parte em iluminação. Estou emocionada, piegas, mas acho que hoje eu posso.

quinta-feira, 17 de março de 2011

É faca na meia-calça

Viver é assistir canal de compras, na televisão. Impossível receber tudo o que se promete. Fato já ilustrado pelo dilema clássico da publicidade (para a galera com mais de 30 anos), podem as facas Ginsu cortar as indestrutíveis meias Vivarina? 

O mais difícil é que para a vida não existe código de defesa para choramingar da propaganda enganosa. E nem Ambervision nos livra dessa imagem nociva. E para quem sentiu reacender a dúvida, cortar sim, desfiar nunca, as Vivarinas não desfiam.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Pais e filhos, economizando no analista

A vida social deles é mais intensa que a dos três filhos juntos. Recentemente, alugaram um cafofo em um camping para curtir novas baladas e amigos. Outro dia queimaram "merda de vaca" para saber qual era o barato. Voltam da praia torrados porque "esqueceram de passar protetor solar". Paizinho tem blog e agora raramente me pede para corrigir os textos.

E ser adulto, ao contrário do que se pensa, é o filho curtir ver os pais crescerem e se tornarem independentes. Sem mais cobranças e receitas de perfeição, somente companheirismo. De vez em quando, botar a mão na cabeça, se perguntar qual é a próxima que os malucos vão aprontar.

E eles são cada vez mais engraçadinhos...

terça-feira, 15 de março de 2011

Prozac em forma de mantra

Inferno astral e TPM deveriam ser proibidos de coincidir. Já que ainda não existe lei para isso, estou contando os dias para sair da minha sucursal privê do purgatório. 

Ainda mais em semana de auditoria, pouca gente entenderia se eu trabalhasse drogada. Então tenho tomado meu Prozac em forma de mantra e repasso a receita. Mesmo para quem não pratica o budismo, o mantra da Tara Verde tem o poder de gerar muita tranquilidade mental. 




Mantra significa proteção da mente em sânscrito. Além de imagens e palavras, são sons com o poder de gerar transformação mental. No budismo, ele protege a mente contra as aparências e concepções comuns, ou seja, contaminadas por impurezas mentais.

A Tara é um Buda feminino, manifestação da sabedoria última de todos os Budas. Tara significa "Libertadora". Por ser um Buda de sabedoria e uma manifestação do elemento vento completamente purificado, ela é capaz de nos ajudar muito rapidamente. A principal delas é a Tara Verde, mãe protetora dos praticantes kadampa.

Na vida espiritual, também precisamos de uma mãe. Tara é nossa Mãe Sagrada, a quem recorremos em busca de refúgio. Ela protege-nos contra os perigos interiores e exteriores, providencia todas as condições necessárias para nosso treino espiritual, guia-nos e inspira-nos com suas bênçãos ao longo do caminho espiritual.

Se confiarmos na mãe Tara com muita sinceridade e fé, ela nos protegerá contra obstáculos e atenderá todos os nossos desejos. Se recitarmos as 21 estrofes do mantra, receberemos benefícios extrordinários. Essas preces são muito poderosas, pois são o sutra, as palavras textuais de Buda. É bom recitá-las sempre que possível:

OM significa os sagrados corpo, fala e mente de Tara.
TARE Aquela que liberta do sofrimento verdadeiro.
TUTARE que elimina todos os medos.
TURE que concede todo o sucesso.
SOHA significa possa o significado do mantra enraizar-se em minha mente.

Extraído de: http://www.meditadoresurbanos.org.br/

quarta-feira, 9 de março de 2011

Dois cafézinhos e um quebra-cabeças

Quando minha faxineira soube que me tornei budista, foi dar a letra ao seu pastor e voltou horrorizada. Ele a preveniu que budista não acredita em Deus. Em síntese, uma religião pouco auspiciosa a seu ver. E assim, Buda lhe serviu de desculpa até para as barbeiragens que resultaram em objetos quebrados em casa. Tivemos algumas conversas e lhe emprestei um livro sobre o assunto. Sem muitas expectivas.

Na última semana, ela me perguntou como eu estava, enquanto aguardávamos ansiosas pelo café coar no início da manhã. Eu lhe disse que estava bem, muito feliz. E ela prontamente retrucou, é o darma, né? Darma, balbuciei surpresa. É, Lulu, sem dúvida, respondi disfarçando um sorriso, num grande gole de café.

A súbita sensação de realização foi a de encontrar o lugar de mais uma pecinha do quebra-cabeças, não sei se meu ou da simples mulher. Pequenas epifanias são como o aroma do café, tão presente,  nas manhãs apressadas, mas apreciado apenas quando a inspiração é um pouquinho mais profunda.

terça-feira, 8 de março de 2011

Pelo fim do dia internacional da mulher

Uma amiga, trainee de chef de cozinha, contou-me que quando foi admitida na cozinha de um grande hotel foi hostilizada pela equipe totalmente masculina. Chegou a ouvir que cozinha não era lugar de mulher. Afirmação de arrepiar a nuca de gerações passando por Dona Benta, Palmirinha à Nigella. O caso ilustra o papel mal resolvido da mulher contemporânea, mesmo em ambientes antes dominados por elas.

Sempre fui educada para ter carreira profissional, independência emocional e financeira. Mas, desde que me entendo por gente, na maioria dos almoços familiares, eu ajudava a tirar a mesa e lavar louça reclamando da ala masculina que ia cuidar de se espreguiçar e seguir a conversa em outro canto. Somos condicionadas a cuidar e servir mesmo que violentando nossa própria natureza.

E educamos gerações a tratar a mulher de forma utilitária. E não nos questionamos quando condicionamos até mesmo nossa imagem à um universo bem masculino de folhinha de parede de borracharia.

O Dia Internacional da Mulher é motivo de vergonha e tristeza, ainda que reconheçamos seu papel conscientizador. Em meio ao nosso simulacro moderno e ocidental de independência feminina, o dia nos lembra que ainda somos grandes vítimas de abusos físicos e morais e desigualdades sociais.

Adoro toda a força sensível e cercada de deliciosas futilidades que ser mulher representa. Deve ser muito triste para um homem não poder enlouquecer por alguns minutos por encontrar a cor do batom mais linda dos últimos tempos. Mas vou gostar ainda mais de ser mulher quando não houver sentido celebrar um dia internacional da mulher. Felicidade é desfrutar com igualdade de nossas diferenças.

Em tempo, a aprendiz de chef de cozinha hoje é a segunda na hierarquia da equipe enorme de homens. Por outro lado, na minha família, os homens ainda mal sabem manejar a esponja e o detergente.

Dai-me ziriguidum para suportar o telecoteco

Sou branquela por uma mudança de planos de última hora. A enorme quantidade de pintinhas pelo corpo revelam que a pintura não escondeu completamente o que a alma escancara. E depois de um desfile no sambódromo e um bloco de rua, eu me rendi a um sofá delicioso na minha casa. Mas já estou em síndrome de abstinência.

Será que confete vicia?

domingo, 6 de março de 2011

Ju Patinadora filosofando

Estou me achando a Lu Patinadora. Já tenho até minha turma de patins no parque. Idade média 17 anos. Os meninos me adotaram na galera pela cota de inclusão para dificuldade de locomoção.

Super queridos, já me deram várias dicas. Mas o maior aprendizado ainda é caiu, levanta o bundão, sacode a poeira e continua andando. Óbvio, mas tem que vencer o medo de arriscar e a vergonha de tomar um chão em público. E descobri que é mais difícil ficar parada do que deixar o caminho deslizar.

Filsófico para voltinhas de patins, né? Depois dou testemunho se os sucessivos tombos de bunda melhoram a celulite. Agora deixa eu tomar o meu Dorflex.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Poeminha de sonho

Almejar é sonhar coisas possíveis,
Sonhar é almejar coisas impossíveis,
E assim, impossível se torna possível.
adaptado da amiga Pulguenta, que eu amo tanto
Bom carnaval para todos!

Pede pra sair

Diariamente, dê três gotinhas de cicuta para o seu ego. E enquanto ele não se cala definitivamente, tranque-o num quarto, sem direito à tratamento especial. Não o alimente e não dê ouvidos às suas súplicas, pois simplesmente ele não existe. Seu maior inimigo é tão factível quanto o bicho papão.

Quando as coisas vão mal e nos deparamos com situações difíceis, tendemos a considerar a própria situação como o problema, mas na realidade todo problema que experienciamos vem da nossa mente, ensinou Geshe Kelsang Gyatso. O problema não está fora, ele está sempre dentro. Somos a própria caixa de Pandora. Enrole-a num saco e jogue-a no fundo do mar, e desfrute do tranquilo permanecer.

terça-feira, 1 de março de 2011

Troque seu PA por uma corrida no parque

Ultimamente, troquei  tentativas de manter um PA (quem não sabe o que é, pergunta prasamiga) por dois belos companheiros. São novinhos, bonitos e muito divertidos. Eles me levam onde quero. Já me deram alguns tombos, mas nada que não se possa resolver com um pouco de Gelol.

Sou a nova proprietária de um lindo par de patins, meu presente de aniversário muitíssimo adiantado. Estou feliz que nem criança. E o que isso tem com PA? É a tal da endorfina, neurotransmissor, liberado em atividades físicas, que geram euforia e bem-estar. Troquei sessões de sexo selvagem (ai, se mamãe me lê agora) por suaves deslizadas em dias ensolarados. O texto das coleguinhas vizinhas do 3xtrinta me fez pensar no assunto.

A sabida Paty chamou atenção para o fato de que, mesmo em relação à PA, "quando trata-se de algo assim, digamos, tão solto, deve haver ainda mais sinceridade. Se pararmos para observar, tem muito relacionamento informal onde impera muito mais respeito e sinceridade que vários namoros ou casamentos certinhos por aí". Sei bem do que ela fala, visto que fui casada com um hipócrita com discurso mais convincente do que muito santo.

Mesmo depois que me separei, a maioria dos homens que me relacionei era mais complicada que a minha avózinha de quase 90 anos. Carência, ciúmes, imaturidade, falta de transparência foram alguns defeitinhos incontornáveis para a manutenção de uma relação adulta. Mesmo eu me apegando mais fácil que chiclete no cabelo, achei que não valia a pena insistir.

A reclamação entre a mulherada é recorrente. Homem não sabe lidar com mulher independente, que tem casa, carreira, amigos e interesses próprios. E se ela quer apenas uma boa companhia, dá curto-circuito. Eles não estão preparados para exemplares do sexo oposto com os mesmos desejos desinteressados que eles, mesmo que eles não queiram compromisso. Enquanto a gente se liberta do estigma de que mulher é feita para casar, eles ainda estão começando a notar que alguma coisa já mudou.

Tive muito trabalho para me recuperar de um casamento horroroso. Mesmo assim, ainda acredito na união entre duas pessoas. Adoro conhecer histórias de casais felizes, observar velhinhos de mãos dadas, me emocionar em casamentos. Mas tudo isso vale a pena se tiver no mínimo transparência e companheirismo. Enquanto, não encontrar essas qualidades em outra pessoa, libero minhas endorfinas em deliciosos e desengonçados passeios sobre patins. E você, não sabe patinar? Vai correr, pedalar, escalar, dançar, ser feliz!

P.s.: PA= ponto de apoio, tradução da lindinha Bela

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Teste de personalidade

Resultado do teste de personalidade: inconsistente. Tranquilizei a terapeuta quanto à eficiência do mecanismo. Minha incosistência está certificada e os meus impropérios têm selo de procedência.

Mas que me desculpem os psicólogos e todos os testes da revista Nova, Cláudia e afins. O melhor teste de personalidade ainda é perguntar para minha mãe quem eu sou, como estou. Ela nunca deixa nesga de dúvida.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Minha festa

A luz acendeu e a música voltou a tocar inesperadamente. Encontrei todos me sorrindo. Não sabia se esse momento chegaria. Mas sempre abri a porta ansiosa pelo o que me aguardava, até que o momento chegou. Voltar a ser feliz é festa surpresa. Você reúne a motivação e a vida ocupa-se da organização.

Em calma, aproveito essa festa silenciosa que vem acontecendo em mim. A felicidade como convidada, na cabeceira de mesa, patrocinando as contas e os débitos mais antigos. Guardei as feridas não cicatrizadas por baixo do vestido. Danço sozinha no meio da pista.

Não sou mais a que entrou pela porta desprevenida. Sou em paz, mesmo quando não estou em paz. Não tenho mais medo que isso acabe. Manter a música tocando é o meu treino espiritual.

O maestro é bom. É Buda. O melhor cara que conheci nos últimos tempos. Ele me ajuda a organizar essa balada todos os dias. E sorrir sempre.



Alguém adivinha quem está no surdão? Cacilds! 

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Poeminha de mulher carambola



Nasci flor de pitanga em pé de amora
Cresci carambola
Amadureci colibri em casa de joão de barro
Fugi desse mundo bizarro
Virei águia riscando céu afora

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Zécutiva: CSI na firma

A última das crianças, pixações vexatórias, no banheiro masculino. E quando discute-se como pegar o danadinho, fico pensando porque a polícia científica não abre cursos para gestores corporativos. Certamente ia virar MBA.

Enquanto isso, São Grissom nos ilumine.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Felicidade clandestina: espreguiçando a delícia de viver

Sábado à tarde ensolarado, vizinho promove bailinho romântico. Molecada bate bola, cachorrada late. Joaninha invade a sala. Conversa anoitece em vinho gelado e amizade quentinha. Tão bom como espreguiçar a certeza de que viver é uma delícia. Tão simples como os minutinhos a mais que se enrola na cama pela manhã.




P.S.: Amo viver em um bairro que tem gente barulhenta, cachorros enlouquecidos, galos madrugadores, grilos encantadores, picnic de vizinhança na pracinha, festa na laje e vizinho que ouve Marvin Gaye no último volume, durante a faxina de todo sábado. Isso é Sampa, acredite!

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Aceita-se corações arrebentados

Meu coração tem um ótimo delivery. Ele se entrega rapidamente. Uma eficiência de dar nojo. Hoje, foi devolvido todo quebrado, numa caixinha azul com bolinhas brancas junto a gérberas de mais lindas cores. Como só tenho um coração, peguei de volta o produto mesmo danificado. E finalmente aceitei, seremos amigos apenas.

Embora achando que já perdi a garantia, vou levar meu coração na oficina e já volto.  Alguém me empresta o colo enquanto eu colo meu coração? Por que tem hora que cansa ser forte.

"Eu uso óculos escuros
Pras minhas lágrimas esconder
E quando você vem para o meu lado
Ai, as lágrimas começam a correr

E eu sinto aquela coisa no peito
Eu sinto aquela grande confusão
Eu sei que eu sou um vampiro
Que nunca vai ter paz no coração..."

Vampiro

Jorge Mautner

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Encanamentos, furos e camisinhas

Prestadores de serviço, de olho nas desventuras das mulheres que vivem sozinhas, criaram o quebra-galho tipo marido de aluguel. Ele conserta torneira, pendura quadro, troca fechadura e não enche o saco porque não tem janta. Contratei o meu por uma seguradora, mas em dúvida com relação à eficiência. Se desse certo mesmo, o Papa já tinha condenado. Por que depois da camisinha, alguém para consertar o chuveiro, a instituição do matrimônio estaria definitivamente eliminada.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Felicidade clandestina é amigo novo e poesia antiga

Amigos recentes, restaurante novo e causos frescos. Mas uma rodada de declamação de poesia antiga é o melhor batizado para amizade que quer vingar. E a noite termina com chá servido com bulé acima da cabeça do garçom, ao som de Cartola. Um espetáculo para deixar no chinelo até os chás de Alice no seu País das Maravilhas.

E eu sempre me safo com Pessoa...

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Cirurgia bariátrica na alma

Uma pessoa querida comparou episódio vivido por ela, um coma prolongado, à dor de amor. As consequências são parecidas. A ausência temporária de sentidos, e depois a vida tem que ser resignificada, enquanto luta-se contra as seqüelas.

Essa conversa me fez perceber que há tempos saí do coma. Só que estreitei a alma para dificultar a embolia de novos sofrimentos. Mas o resultado é fome cujo nome é solidão. Sou como operado de estômago que lambe chocolate escondido para saciar as compulsões.

Carrego compulsões por questionamentos insolúveis, credulidades dolorosas, tristeza internitente e carência afetiva insaciável.  Mas sei que são sintomas do que sou e não do que me causaram. E não tendo mais para onde ir, decidi que era hora de chegar. 

Só é preciso terminar de desfazer as malas e decidir onde pendurar os quadros.  



p.s.: as sapatilhas de Dorothy são presente de uma menina linda que eu adoro! Viu, como ficaram fofoletes?
O texto espirrou de outro presente, um bate papo com a minha nova amiga mais monga.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Síndrome de picolé: sou um Tablito

Devia criar casca e aprender com os safanões da vida. Mas sou picolé. E quem nasce para palito não se enforma em casquinha. Derreto fácil. E escorro a cada pequena ou grande desilusão.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Zécutiva: não faça o que faço, obedeça se tiver juízo

Conhecer os intestinos do maior porto da América Latina é ter certeza que o Brasil não escoa sua mercadoria, escorre. Pelas pernas como um enorme desarranjo. O caos no trânsito, a falta de sinalização, a sujeira, a desordem lembram um faroeste cabloco mecanizado. Entretanto, quem quer ser fornecedor de estatais nacionais tem que comer muita grama para atender requisitos, normas, burocracias etc.

Ser fornecedor de empresa estatal brasileira é como ter pais doidões e ser mandado para colégio interno católico. Você convive com milhares de regras e requisitos, mas, quando vai para a casa, encontra a galera fumando, uma festa rolando, a geladeira vazia e todos os cômodos bagunçados.

É o moderníssimo modelo de gestão que já apregoava meu avôzinho: faça o que eu mando, não faça o que eu faço. Mas está tudo certo já que seguimos a máxima: manda quem pode, obedece quem tem juízo, ou conta para pagar.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Aprendizado de pequena mulher

No caminho do restaurante em que almoço, há uma pequena loja de roupas de senhoras. As vendedoras batem papo com as vizinhas de avental e pano de prato no ombro na calçada, enquanto um cachorro preto se enrola em suas pernas, ao sol. Os manequins usam perucas tortas e os manequins infatis são bonecas tradicionais. De fora, nota-se uma (des)organização de roupas em estantes e cabides espalhados inexistentes nos comércios assépticos atuais.

Toda vez que passo em frente, inevitável a vontade de entrar e retomar um tempo quando ia às lojinhas de bairro, com minhas mãos minúsculas e gordinhas agarradas às da minha avó. E ficava horas ganhando balas, enquanto a conversa fiava em problemas femininos insolúveis. O pó da rua a se sobrepor à faxina diária, o preço do leite, a banca da feira que não tem mais qualidade, o marido da comadre que bebe e o tecido mais adequado para a blusa das missas dominicais.

Ouvia certa de que aquilo me prepararia para meu futuro como mulher. E anotava mentalmente soluções. Entretanto, hoje, a faxina apenas pago e lamento o poder de destruição em massa da faxineira. Não tomo leite. Vou ao supermercado altas horas da noite e dou-me por feliz em achar alguma verdura. Marido quem tem dá graças a Deus e fica quieta. Missa nem de sétimo dia. E daquelas conversas, que julgava úteis, só restou desejo de encontrar, entre as prateleiras entulhadas da lojinha dos meus dias, um tempo que sirva para mim. Como se eu pudesse ser uma daquelas mulheres, tão senhoras de seus mundos, armadas somente com seus panos de prato no ombro.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Por Manoel pedaços de mim

"Com pedaços de mim eu monto um ser atônito.
Tudo que não invento é falso.
Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira.
Não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou.
É mais fácil fazer da tolice um regalo do que da sensatez.
Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada; mas se não desejo contar nada, faço poesia.
Melhor jeito que achei para me conhecer foi fazendo o contrário.
A inércia é o meu ato principal.
Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas.
O artista é um erro da natureza. Beethoven foi um erro perfeito.
A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.
Quero a palavra que sirva na boca dos passarinhos.
Por pudor sou impuro.
Não preciso do fim para chegar.
De tudo haveria de ficar para nós um sentimento longínquo de coisa esquecida na terra — Como um lápis numa península.
Do lugar onde estou já fui embora".
Livro sobre o nada - Manoel de Barros


sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Até amar o Corinthians é iluminação

Quem acha que a vida não é justa, certamente está desajustado. Os sete bilhões de habitantes desse planeta desejam a felicidade. Mas a maioria tenta reformar o mundo ao seu redor para satisfação dos desejos. O resultado é apenas caos, frustração, depressão.

Sofrimento e alegria não são castigo ou prêmio. São efeito do esforço de mudar-se internamente. Difícil aceitar, crianças mimadas que somos, chacoalhamos a máquina de doce do samsara e nunca alcançamos a guloseima desejada. Isso quando ela não engole suas moedas e te deixa com fome ou sede.

O caminho do meio é o equilíbrio entre a renúncia a todos esses sofrimentos e a compaixão. Aprender com os obstáculos, não se apegar às perdas e injustiças da máquinas de doces. E aprender a amar todos os seres vivos. "Quando eu amar os outros, a ponto de me desesperar, nunca mais sofrerei", ensina meu professor de meditação Gen Kelsang Odro. É forma de esvaziar nosso egoísmo e apego a esse eu que sofre, deseja, resmunga.

Fácil? De forma nenhuma. Espiritualmente, engatinhamos. Mas quer moleza? Torce para o São Paulo, como diria um tio meu, Como corintiana não praticante, começo a concordar com ele, mas mantenho-me fiel ao time que só nos dá crescimento espiritual, aceitando com alegria as seguidas derrotas. Timão é treino para iluminação! Libertação, mesmo sem Libertadores.

Palestra do meu prô Odro, queridíssimo!



quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Zécutiva: Trabalhadores unidos aceitam cheque

Pedir R$ 2,00 para o porteiro para inteirar o táxi é melhor que qualquer atividade de integração hierárquica. E sorte que minha faxineira aceita cheque.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Poeminha para Dona Janaína

Por você seria marinheiro.
E toda barca de presente, espelho, flor e pente,
Era pouco para meus olhos altaneiros.
Que esses eu te dava como garantia
Para poder mirar seu mar todos os dias

Vambôra molhar os pézinhos no mar, que hoje é dia de Yemanjá.



Buda entende que com essa mulherada, Dona Janaína*, Cidinha* e Tarinha* ninguém pode. E lá em casa, a Babel é ecumênica e harmoniosa, e me garanto com quatro mães para me dengar.

(*Yemanjá, Nossa Senhora Aparecida e Tara Verde)

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

É bom para o moral

Meu jardim semeei num canto de terra quase imprestável. Horas de palavras cultivadas com esmero de  relojoeiro, sem pretensão de frutos. Entretanto, suas flores me trouxeram apreciadores queridos. Hoje temo que um ponto final mal plantado, uma idéia murcha ou uma frase despetalada estrague a beleza da obra.

Mas, como criança apreensiva mostrando seu desenho novo, sou feliz a cada gesto de aprovação. Como diria Rita Cadillac, é bom para o moral. E eu nem precisei rebolar.

Daí aumenta a vontade de plantar uma floresta inteira. Vontade que já cheguei a pensar que nunca mais teria. Por fim, atendo um desejo enorme de agradecer quem estimulou e estimula minha vontade de reflorestar o planeta.

Obrigada!

E para os seguidores dessa terapia, uma dica de uso da dinda do enquadrados:

"Aproveite muito mais
Você sabe como faz
Você não vai pagar nenhuma taxa se usar


É bom para o moral
É bom para o moral
É bom para o moral
É bom bom, é bom bom

"Vu le", "vu le", dance dance
Para frente, para trás"

Aumenta o som aí...




segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Síndrome de plano infinito

Eu costumava ser centrada, o problema é que ultimamente é tanta coisa que está difícil localizar a borda.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Chapada em delicadezas

Quando o itinerário da alma tem destino imprevisível e muito além do corpo, uma viagem cumpre seu papel. E quem de fato se propõe a conhecer a Chapada dos Veadeiros (GO) surpreende-se o quão distante pode chegar. E assim, eu fui, sem saber que iria tão longe.

Olho de gente da cidade é anêmico por conta da dieta pobre de horizontes. Quando exposta a um banquete, demora um tantinho para digerir cor e amplidão fartas. E o céu de Goiás vai como que nutrindo olhares em grandes goles de um azul incomparável ao longo da estrada judiada que liga Brasília à Alto Paraíso.




 E depois que o olho fica sedento por mais goles, a gente se embrenha no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Dos grupos que se formam na entrada, nosso grupo tinha Andrew, um médico americano interessado em tratamentos medicinais alternativos e em conhecer  João de Deus, um médim curador que atrai multidões de todo o mundo para Abadiânia (GO), cidade que o gringo pronunciava como algo parecido como vagina, provocando gargalhadas.

O guia de nosso grupo foi Rafael de São Jorge, nome do pequeno município onde fica a entrada do parque. Rafael estudou quatro anos de biologia, desistiu da graduação e se especializou por conta própria em guiagens científicas. Ele é um dos apenas três guias que fala inglês fluente no parque. Aceitou guiar nosso grupo se aceitássemos que ele mostrasse a Andrew todas as plantas de uso medicinal pelo caminho em inglês. Ninguém pensou duas vezes, parecia mais um presente. E Rafael foi nos apresentando as plantas como quem introduz velhos conhecidos, nome popular e científico e seus diversos usos. 




Um dia de enormes horas de caminhada em meio ao cerrado, e o corpo expandindo limites do cansaço. A compensação foi meditar à beira de enormes canyons e nadar nas cachoeiras da Louquinhas, assistindo um louquinho sob efeito de beberagem de Santo Daime se batizar comicamente nas águas, para desespero dos salva-vidas do parque. Final do dia regado à muita cerveja no pequeno Bar do Pelé e depois muita comida "home-made" na Dona Nezinha. Nosso médico americano enlouqueu os locais habitués alcolizados do pequeno estabelecimento com sua língua enrolada. O que esse "homi" está falando enrolado, eu não dou conta, porra - repetia o mais conversador deles. Em compensação, o simpático garçom da Nezinha arrancou aplausos arranhando o inglês aprendido nas ruas.




E conversa boa, junto com comida melhor ainda é o que não falta entre esses goianos. Segundo Daniel, doce e falador garçom da nossa pousada, na palhoça do seu Waldomiro, come-se a melhor matula da região.  Comida de boaideiro, ex-ocupação do dono do lugar, que recebe a todos com abraços na porta do carro e só não senta de vez nas mesas para a prosa porque tem muita gente para conversar. Cozinhar ele aprendeu com a mãe, hoje divide o negócio com os seis filhos e agregados que chegam a dezenas. Faz pinga e licor de sabor doce e amargo também, esse para temperar a vida, já que a dele, segundo o próprio, já é muito doce. A minha pinga foi com arnica. O doce de leite vem no pote com as colheres junto para mandar ao diabo qualquer dieta. E o doce de casca de laranja trouxe o carinho da lembrança dos doces da minha tia-bisavó Dula.
  




Andei pelo Vale da Lua, uma impressionante superfície de rochas entrecortadas por um rio. À noite, nadei em piscinas termais rodeadas de sapinhos que coachavam loucamente, tentando expulsar turistas indesejáveis de seu ofurô natural. Alimentei dezenas de pernilongos famintos. Deixei pedaços de pele nas ranhuras das pedras em alguns tombos. Trouxe uma dezena de roxos, dores musculares e uma alma expandida que quase não se cabe em mim.

No parque, ao longo da trilha, a vegetação mostrava sinais de carbonização, principalmente nos troncos de árvores que insistiam em desenvolver folhas verdinhas. O guia Rafael explicou que incêndios por causas naturais, como raios, são comuns no cerrado. O fogo é rápido como uma lufada de vento. Transforma matéria orgânica em mineral, facilitando a fertilização do solo rochoso do lugar.

O cerrado é pouco resistente ao fogo, mas extremamente resiliente, pontuou Rafael. Em comparação com outros habitats, embora incendeie facilmente também tem enorme capacidade de recuperação, fazendo do fogo um instrumento para fertilidade. E eu com meus botões, fiquei pensando na minha alma, tão incendiada e recuperada como o cerrado. E gostei ainda mais daquele lugar que já me mata de saudades.






  As fotos sensacionais são do meu companheiro de viagem, meu irmãozinho caçula, no momento, mais velho que eu três anos, e muito paciente com meu atrapalhamento em terrenos acidentados.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Poeminha feliz

Felicidade,
Se eu toco, é miragem.
Se eu sinto, é realidade.


Budinhas simpáticos com desejos de felicidade para todos!

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Zécutiva: Felicidade clandestina sob mesas de reunião

Se há um terreno em que, a cada gargalhada, você é medido como um marginal portador de cigarrinhos do capeta é no ambiente corporativo. A felicidade é clandestina e perseguida, como pontificou minha traficante preferida, a Monga Executiva.

"É preciso muita firmeza de propósitos pra convencer os decisores das intituições de que nós, usuários e defensores desta morfina organizacional chamada FELICIDADE podemos exercer dignamente as funções para as quais somos pagos fazendo uso dela".

Adorei ter uma companheira na campanha de legalização da felicidade (e ela me lê, que emoção). Sorriso e humor leve deveriam constar nos requisitos de descrição de funções, com atenuantes para os dias de TPM, óbvio. Nesses dias, até aceito um "bom dia porque".

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Afogando tartarugas

Eu e meu irmão tínhamos duas tartarugas.  Entediadas pela vida aquática, elas insistiam em pular do aquário. E caminhavam camufladas pelo tapete verde da sala ou pelas lajotas verdes do quintal. Em cada fuga, uma gritaria. Criança da cidade não bota mão em coisa viva. E minha avó saia à captura dos bichos. Xingando em portunhol enrolado, despejava as pobres de volta ao cativeiro envidraçado.

Foram muitas tentativas de exploração terrestre, até que minha avó, exasperada pelas caçadas imprevistas, resolveu definitivamente o assunto. Jogou as tartarugas na privada e deu a descarga. Sem muitas explicações, porque espanhola resolve, não explica.

Ela imigrou ao Brasil, depois de uma longa estadia em campos de concentração na França para fugitivos da Guerra Civil Espanhola. Chegou com outros espanhóis que, por fim, voltaram à Espanha. Perdeu o marido cedo. Tornou-se uma mulher prática.Vivia só, resolvia as coisas a seu jeito, mesmo que tivesse que afogar tartarugas. Creio que nem feliz nem triste. Aceitava resignada o exílio que a vida, as guerras, a distância lhe proporcionaram.

Aos 87 anos, adoeceu gravemente e passou cerca de três meses encerrada num quarto cinza de hospital, ligada a um respirador. Nesse período, não aceitava televisão, rádio, livro ou qualquer distração que lhe amenizasse o calvário. Passava horas de olhos fechados, só o som mecânico do pulmão imposto a marcar tempo. Não sei o que pensava. Acredito que recuperava os fatos que ao longo da vida teve que esquecer para sobreviver.

Mais de uma vez, ela sugeriu que a desligassem daquela máquina irritante. Hoje, acredito que era a melhor alternativa, dadas as condições. Mas com 19 anos,  eu só conseguia me horrorizar e cantar. Das poucas canções que ela aceitava ouvir era "Maria Bonita", que segundo meu pai, foi a prefirida do meu avô. Uma linda letra que fala justamente de lembranças. Exaltava recordações de um homem apaixonado. Talvez meu avô cantasse para ela, que também era Maria.

Quando ela se foi, sobreviveu comigo a tristeza de ter acompanhado seus últimos dias. Mas minha avó era a sobrevivente, e me mostrou que tudo aquilo que chateia merece ser descartado, sem explicações. Isso é ser sobrevivente. 

Desde então, eu me tornei especialista em descartar fatos desagradáveis. E quando não suporto mais tantas tartarugas afogadas, ao meu redor, busco meu consolo. Lembro que até minha avó, uma espanhola, endurecida pela guerra e campos de concentração, sobreviveu, e conseguiu salvar até o fim sua Maria Bonita.

"Acuérdate de Acapulco,
de aquellas noches,
María bonita,
María del alma.
Acuérdate que en la playa
con tus manitas
las estrellitas
las enjuagabas
Tu cuerpo del mar juguete,
nave al garete,
venían las olas,
lo columpiaban,
y mientras yo te miraba,
te juro con sentimiento,
mi pensamiento te traicionaba".

Augustín Lara

sábado, 15 de janeiro de 2011

Inspiração de bunda de fora

Depois que se passa muito tempo sobrevivendo, viver não é mais natural. É desligar o respirador artificial. Sem marcapasso. Percurso em respiração livre. Inspira e expira. Sem a certeza da próxima lufada. Livre para perder o fôlego.

Encho os pulmões, até que doam de não se caber mais. Mas ainda de camisolinha de quarto de hospital. De bunda de fora. Mas muitas inspirações no último ano dão coragem para ir cada vez mais longe...