segunda-feira, 28 de julho de 2014

Para vidas de pastel de vento

Nos últimos meses, eu me pego reclamando mais que o usual. Tendo insônias mais que o suportável. E me zangando desavergonhadamente comigo e com todo o mundo. Em algum momento, deixei escapar a válvula que controla essas sensações perturbadoras, a raiva, a ansiedade, o medo - as delusões como os budistas preferem chamar. 

Não é fácil apontar quando esse maremoto de resmungos tomou conta do laguinho das minhas emoções. Mas o fato é que é preciso esforço grande para aquietar as ondas que perturbam qualquer possibilidade de clareza mental. 


O emissário de esgoto mental uma vez aberto contamina outros pensamentos e ações. São pequenas violências de corpo, fala e mente repetidas à exaustão para ferir os outros e, principalmente, ferir a mim mesma. Tudo parece pior do que realmente é, as palavras são mais irônicas e insidiosas do que deveriam e me coloco em situações que só aumentam minha inquietação.



É tudo uma questão de familiaridade. E a nossa sociedade nos familiariza com a eterna insatisfação através de padrões de vida e consumo exigentes, relacionamentos superficiais e efêmeros em que as soluções de conflitos em geral são violentas.

E não tem chocolate, roupa, viagem, Tinder, TV a cabo com 100 canais, balada que fechem esse enorme buraco cavado pelo egoísmo: eu quero, eu preciso, eu sofro, eu estou farta, eu não aguento mais. OK, falo por mim! A dona dessa vida de pastel de vento, que murcha quando qualquer pedaço é tirado do lugar.

Em um dos textos do seu blog, a Monja Cohen faz um questionamento. "Será que estamos conscientemente vivendo nossas vidas e direcionando nossos pensamentos, ações e palavras para o sentido de mudança que queremos e sonhamos? Mahatma Gandhi disse: "Temos de ser a transformação que queremos no mundo"".

Definitivamente, eu tenho direcionado minha mente e meu mundo para um cenário obscuro. As justificativas são o stress, muito trabalho, a última separação, estudar para prova de derivativos, a Copa do mundo, a auditoria na empresa. Sobram desculpas, não resta nenhuma atitude, aparecem as consequências. Uma vida insuportavelmente chata. Duro admitir.

O que realmente funciona para mudar isso? Talvez olhar mais para dentro. Estar mais no presente. Ser menos ansiosa com o que vai acontecer, não sofrer com o que aconteceu. E principalmente ser mais generosa, grata e compassiva, comigo e com o mundo.
"Estudar o Caminho de Buda é estudar a si mesmo. Estudar a si mesmo é esquecer-se de si mesmo. Esquecer-se de si mesmo é ser iluminado por tudo que existe. Transcender corpo e mente seu e dos outros. Nenhum traço de iluminação permanece e a Iluminação é colocada à disposição de todos os seres." (Mestre Zen Eihei Dogen - 1200-1253). Que eu possa esquecer um pouco de mim mesma, e me deixar iluminar por esse mundo bonito que me rodeia.

Texto da Monja Cohen: aqui


quinta-feira, 24 de julho de 2014

Audições de vô Acácio

Saudade é quando a gente não sabe se lembra ou se inventa. E é com saudades que lembro que foram em sábados compridos ou dias de férias ensolaradas que eu aprendi a me apaixonar pelo samba. Eu e meu avô sentados nas cadeiras de praia espalhadas na varanda da chácara.  Vendo o sol se alaranjar no poente, ouvindo Jair Rodrigues cantando samba canção. 

Num desses dias, também comecei a sofrer com o samba. O telefone interrompeu a audiência de serestas com a notícia que meu tio-avô morreu. Depois disso, naquela tarde, não teve piada, meu avô não contou história repetida, não deu risada, não me puxou os pêlos do braço chamando de neta de um burro. 

Com os olhinhos cheios d´água é que meu avô acabou de ouvir a fita cassete do Jair, no radinho Panasonic. Relembrou uma ou duas histórias do irmão recém-falecido e foi se deitar mais cedo em quietude enlutada. Foi novidade assustadora para mim. Ainda bem criança, assisti ali paralisada nascer uma saudade daquelas mais doloridas que só a morte consegue criar.

E assim como a saudade inventa essas tardes, inventa outras nostalgias bonitas, quando escuto  Jair Rodrigues, Cartola, Nelson Cavaquinho e tantos outros sambistas. É tanta coisa que a saudade inventa, enfeita, mistura da vida da gente - amigos, gente que se foi, momentos, amores, alegrias - que chego não me importar que doa tanto. 

Para sentir saudade é preciso ter coragem. Para ouvir um samba é preciso lembrar de você meu avô que me ensinou essas enormes saudades que eu sinto hoje.


Para vô Acácio, essa música que fala de um cara incrível como ele. Mais que sua neta, eu para sempre vou ficar sua fã:

Naquela mesa
Sergio Bittencourt

Naquela mesa ele sentava sempre 
E me dizia sempre o que é viver melhor 
Naquela mesa ele contava histórias 
Que hoje na memória eu guardo e sei de cor 
Naquela mesa ele juntava gente 
E contava contente o que fez de manhã 
E nos seus olhos era tanto brilho 
Que mais que seu filho 
Eu fiquei seu fã 
Eu não sabia que doía tanto 
Uma mesa num canto, uma casa e um jardim 
Se eu soubesse o quanto dói a vida 
Essa dor tão doída, não doía assim 
Agora resta uma mesa na sala 
E hoje ninguém mais fala do seu bandolim 
Naquela mesa ta faltando ele 
E a saudade dele ta doendo em mim 
Naquela mesa ta faltando ele 

E a saudade dele ta doendo em mim 


quarta-feira, 23 de julho de 2014

Aula de artes

Soucacosencaixados

Mosaicodefelicidade

O que não

encaixa      des  

                   car           

                      t  o