terça-feira, 22 de junho de 2010

Por uma vida barata

Invejava a inconsciência das baratas. Satisfazer-se em ser somente corpo e carapaça. Não mais sentir. Porque sentir é câncer, que toma a alma em metástase. E o tratamento é irônico de tão ruim quanto a doença, matar células e  todo entorno.

Maquiava os olhos. Não suportaria enxergar o mundo sem cílios emplastrados de rímel. Era somente seu jeito de se fazer barata. Como as antenas inquietas do inseto, pestanejava cílios marcados para descobrir o mundo.

Descobriu homens, mulheres, crianças, cidades, mares, camas, paisagens. Depois de centenas de tubos de rímel, encontrou bem na sua cozinha uma barata que surgiu da obra do apartamento vizinho. Finalmente, passou noites tranquilas em frente ao espelho contemplando a companheira.

Por milhões de anos, a barata desenvolveu sua estupidez esculpida na capacidade insuperável de sobrevivência. Mas ela não aprendeu. Encerrou em veneno com bolachas. Foi encontrada, cercada por dezenas de baratas. Finalmente, seu barato, era somente um corpo, sem carapaça.

5 comentários:

  1. Ju, interessante..se a barata evoluísse em consciência humana, não sobraria uma baratinha..perderia a capacidade de cuidar umas das outras.
    Prefiro você emoldurada por rímel, ora borrado por lágrimas.
    Cafi

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  2. AHAHAH Jujuba,
    que papo é esse? ontem monja hoje barata
    Putz to ficando preocupado, que deprê é essa gata? daqui a pouco vai por pra brigar o objeto do desejo com o outro da mesma espécie. Ta comum isso e a coisa ja ta escassa.
    Anima ai
    Fui

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  3. você está tomada pelo espírito da clarice mulher!!! lembrei de "a paixão segundo GH"! pura metafísica! tem um lance dela ficar com vontade de comer a barata! delírio! cuidado hem?! heheh
    beijo :O)
    marta

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  4. você falou que sempre teve vontade de ser uma barata... e eu que sempre tive vontade, quando criança, de ser uma mendiga? será que essas vontades são anormais? acho que realmente somos serzinhos inadaptáveis!
    :O)

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  5. É só a vontade de me libertar de arestas, aguçada por exageros no meu tratamento de choque de rehumanização. Remédio em dose equivocada envenena. E eu sou uma consumidora infantil.

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